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Poesia - 2002 / 2005

 

 

2005

 
Longe
     
 

Longe

é não estar a teu lado

sentir a tua mão

apertando a minha

procurando refúgio

no deserto

das tuas causas breves.

 

Longe

é não ralhar contigo

repetir sem fim

motivos e razões inúteis

dar-te o aconchego

dos momentos possíveis.

 

Talvez um dia

o longe seja perto

e o amor e a paixão

intervalados de dúvidas

sejam dias completos.

 

Vilamoura, 19-02-2005

 
     
  Abismos  
     
 

Vou devagarinho

pé ante pé

experimentando o nada

 

Quedo-me nos abismos

dos silêncios

reveladores

 

Não choro, não grito

não digo nada

A boca fica cerrada

como o túmulo

dos fantasmas adormecidos

que povoam o meu corpo

Cansado.

 

Lisboa, 27-01-2005

 
 

 

2004

 
  Dá corda aos sapatos  
     
 

Dá corda aos sapatos

põe-te daqui para fora

é agora que vais crescer

 

Esquece a família, o cão

vai, põe-te a mexer

gela o coração, usa a cabeça

decora aquele ditado

“o destino é feito por ti”

sai daqui, vai embora

 

A gente não tem condição

para te sustentar, dar-te o pão

somos pobres, sem tostão

 

Ão, ão... Tu é que és o cão!

 

Vilamoura, 22-12-2004

 
     
  Linha recta  
     
 

És como uma linha recta

no caminho entre nós

 

Eu complico, crio atalhos

tu chegas tão depressa

que te impacientas da espera

que azeda o lume

 

Quando, por fim, descansamos

Ao pôr-do-sol do sexo louco

transviamos de novo, buscando

o que sempre sabe a pouco.

 

Vilamoura, 14-09-2004

 
     
  Grande finale  
     
 

Quando perdes o controlo

e pedes mais e mais

sinto medo de me faltarem as achas

para a fogueira que incendiei.

 

Mas o teu corpo pede

e o meu, escravo da tua volúpia,

junta os fragmentos de energia

e, em minutos multiplicados,

construímos o nosso Grande Finale.

 

Vilamoura, 21-06-2004

 
     
  Anjo negro  
     
 

Anjo negro da morte,

que me queres?

 

Desfiar os meus pecados,

por a nu os meus segredos,

dar sentido aos meus medos,

cortar as linhas podres

que amarram os bocados?

 

Queres levar-me, assim

desfeito, inimigo de mim?

Sem uma oportunidade,

sem uma última vontade?

Pela sucção das tuas asas,

adejando sobre os fantasmas

que povoam o meu inverno,

do Inferno em que vivo?

 

O que poderia ter sido...

A voz, sempre escutada, das saudades,

fez-me voltar, vezes sem conta, ao rio.

 

Leva-me, leva-me depressa.

Inteiro, aos bocados, como quiseres.

Esqueci receios, a terra que abriu

sobre os pés, o sal das tempestades,

a água que me engoliu e vomitou

antes do meu cadáver chegar à foz.

 

Chegou o momento de cumprir o destino.

Leva-me, leva-me depressa...

Anjo Negro da Morte.

 

Lisboa, 03-05-2004

 
     
  Cavalo louco  
     
 

Houve tempos

em que o tempo

passava devagar

 

Hoje tem o passo

de um cavalo louco

com o freio nos dentes

  

Já não sinto as asas

não controlo o voo

não traço rotas nem rumos

 

Viajo singelamente

por onde e aonde

as ondas e as marés tardias

deixam que ainda navegue

 

Vilamoura, 08.04.2004

 
     
  Milímetros  
     
 

Um milímetro

é a medida exacta

do espaço que conquisto

em cada encontro contigo.

 

És como uma montanha agreste,

coberta de gelo por vezes.

Inacessível, escorregadia, fatal.

Sei dos perigos que corro, a cada passo,

do abismo voraz que me aguarda,

no vazio azul dos teus olhos felinos.

 

Estou entre o céu e a terra profana,

envolvido por nuvens cinzentas, escuras,

num purgatório de expiações consentidas.

 

Não sei se te amo assim tanto

ou se quero apenas superar o meu ciúme.

 

Vilamoura, 08-04-2004

 
     
  As voltas da vida  
     
 

Tristes são os tristes

que pensam que a vida

é assim tão simples

 

A gente dá voltas

inventa revoltas, gastas

e volta ao começo

 

As coisas acontecem

simplesmente

É como a areia do deserto

varrida pelo vento incerto

mudando as dunas

a paisagem agreste

Não há um oásis salvador

apenas um lugar recriado

imaginado no momento

 

Somos areia em movimento

 

Lisboa, 23-03-2004

 
     
  Farol  
     
 

Pedra a pedra

construí um Farol

 que perpassa a noite

da tua ausência

e incendeia cada vez

que sinto os teu dedos

no meu corpo abandonado

 

à tua vontade

 

Lisboa, 20-03-2004

 
     
 A dor que dói mais
     
 

Dói a dor mais aguda,

que as outras ficam macias,

toleradas pelo tempo.

 

Todas as dores juntas

não doem mais do que esta

- a que me fazes sofrer,

a que me desfaz em pedaços.

 

Não há poção, unguento,

remédio ou terapia.

É uma doença crónica:

- Não consigo deixar de gostar

de ti!

 

Lisboa, 20-03-2004

 
     
  A Taberna  
     
 

Quem me procura na noite

encontra-me na esquina

- a taberna do meu bairro

 

É lá que tempero a vida

e falo das coisa fúteis

com os bêbados habituais

 

Gente simples, abandonada

recriando histórias vagas

de feitos e glórias imaginados

de passado e futuro trespassados

 

É assim que passo a noite

na taberna do meu bairro

 

Adulterado!

 

Lisboa, 20-03-2004

 
     
  No limite  
     
 

Pôs um pé

depois outro

no limite

 

Mediu a distância

respirou fundo

ficou parado

 

Uma lágrima rebelde

escorreu pela cara

saboreou o sal

 

Quis gritar por ajuda

mas a voz não saiu

dos lábios cerrados

 

Estava num impasse

entre a vida e a morte

dividido pela vontade

 

de ir ou ficar vazio.

 

 Lisboa, 20-03-2004

 
     
  Uma palavra  
     
 

das palavras, uma

a que te digo ao ouvido

segredo só nosso

 

nos dias nebulosos

essa palavra ressoa

entranha-se

fere, quase mata

 

nos dias mais claros

sobrevém um sorriso

uma luz ao olhar

um alento ao corpo

e com ele fazemos

 

amor

 

Lisboa, 12-02-2004

 
     
  Portugal Hoje  
     
 

Das caravelas

Herdei o escorbuto

Símio de terra perdida

Cuspindo o sangue

Das gengivas descarnadas

 

Nada. A minha vida foi assim

Vazia, como o Portugal

De Hoje

 

Lisboa, 04-02-2004

 
     
  Abismo  
     
 

Ela deu um passo

Ele deu outro

Ambos caíram

No abismo

Do vórtice

Que haviam criado

 

Lisboa, 04-02-2004

 

 

 

 

 

A Foca

 

 

 

 

 

Brinca com a bola

sobre o focinho

enfoca um brilhozinho

nos olhos

 

O menino traquinas

vem de mansinho

emborca uma coca-cola

atira a garrafa

contra a cachola

da foca

 

A bola salta

o bicho geme

o tratador treme

o público maltrata

o gaiato chato

o pai cai

racha a cabeça

a mãe, em defesa, vai

às fuças de alguém

 

Com desdém

a foca volta costas

enfia-se na casota

fecha a porta

e descansa enfastiada

sem mais nada

 

Lisboa, 26.01.2004

 
 

 

2003

 
  Forças da Natureza  
     
 

O sol. As nuvens. A chuva.

O relâmpago repentino.

O som aterrador do trovão.

O céu desabou sobre a terra.

 

É o dilúvio!

 

O raio ziguezagueia cortante,

queimando, reduzindo a cinzas,

vegetação, pedras, árvores, animais,

como um laser gigante, vingador.

A dor rasga almas, em preces, rezas.

Santa Bárbara, lembrada, luz divina.

A terra estremece, ressoando o som,

estarrecendo, prolongando o medo.

 

Um ruído surdo, que os animais entendem,

vindo do nada, engrossa, abre fendas.

Lavra a terra como mil arados sem rumo.

Desenraíza troncos, faz rolar as pedras.

As casas estremecem, chocalhando.

As telhas escorregam pelas empenas.

As paredes abrem rachas, esventrando-se.

As pessoas morrem sobre os escombros.

 

É o fim do Mundo!

 

Eu não sei. Não sei se tive um pesadelo.

Já não sei. Distinguir o sonho da realidade.

Nunca soube. Pressentir o medo, as agonias,

que cortam a vida em fatias desencontradas.

Vivo do nada. A minha força entronca algures,

nas forças vivas e decepadas da natureza.

 

Lisboa, 30-12-2003

 
     
  Intimidade  
     
 

Queres ir ao alto da minha arrogância

e ao fundo da minha solidão?

 

Queres ver como sou no meu apartamento,

adaptado por um arquitecto famoso

na zona mais inn de Lisboa?

 

Queres ver-me informal,

de t-shirt e de calções,

despido dos artefactos de marca?

 

É contigo!

Mas aviso-te que vais ter uma surpresa.

 

Vilamoura, 20-12-2003

 
     
  Gotas de chuva  
     
 

As gotas da chuva cantam

baladas na minha janela.

Escrevem mensagens ternas,

que só eu sei decifrar.

 

Vão, assim, devagarinho,

embalando-me em mais uma noite

povoada de fantasmas sem rosto.

 

Porque me recuso a ver

a realidade.

  

Lisboa, 31-10-2003

 
     
  A liga liga a meia  
     
 

A liga liga a meia à perna

A meia entra a meias pelos pés

Os pés são o fim das pernas

 

Deitado, com um pé dela de cada lado

Vêm-se as meias e o resto das pernas

E a entrada que dá acesso ao corpo

Do lado mais apetecível, o de dentro.

 

Lisboa, 24-09-2003

 
     
  O Bruxo  
     
 

O bucho do bruxo era enorme.

Comia, bebia, tudo o que vinha.

Por fim, arrotava de satisfação.

O Parceiro, que era um cão,

lambuzava-se com os restos.

 

Ambos dormiam pela tarde

uma sesta inquieta, quase funesta,

mãos e patas sobre as panças inchadas,

ressonando como o aparato das trovoadas.

Às vezes paravam, coçavam-se, estremeciam

e recomeçavam, com um sorriso crispado.

 

Quando acordavam, o bruxo fazia mistelas.

O cão, longe delas, metia-se a um canto.

Raramente dava certo, mas se descobria,

o bruxo gritava: “Eureka, eureka, eureka!”.

Então o cão gania, uivava, rebolava,

e escondia-se no meio das panelas.

 

Certo dia, num sucesso ainda indefinido,

o bruxo provou da poção borbulhante.

De repente, deu-lhe um enguiço galopante

e inchou todinho, como um repolho cozido.

Esverdeado, babando um líquido amarelo,

explodiu, cobrindo as paredes da cozinha.

 

A vizinha, aterrada, admirou o pastiche,

chamou a polícia e dormiu mais descansada.

Ninguém quis o Parceiro, que morreu sozinho

junto do caldeirão, patas sobre o focinho,

escanzelado – triste fado de um caniche!

 

Lisboa, 16-05-2003

 
     
  Gaivota do Tejo  
     
 

As gaivotas brincam com o vento,

rasando a espuma das ondas do Tejo.

Há  uma branca que se destaca

- elegante, planando a tarde.

 

O cacilheiro luta contra a maré

- leva gentes cansadas, dormentes.

Os turistas disparam muitas fotos

ao monumento dos Descobrimentos

- vêm de toda a parte admirar Lisboa.

 

O Bugio convida-me, ao longe,

para além do mar que ilumina à noite

- sei que não posso fugir de mergulhar

neste interior deserto de vontade.

Fecho os olhos e sinto-me embalado

pelo doce torpor das agonias breves.

  

Lisboa, 28-04-2003

 
     
  Anglo recto  
     
 

Não confies neste anglo recto da vida.

São muitas cogitações sobre nós...

Perdemos o fio divisor da sensatez prudente

e da conquista sem barreiras e condições.

 

Entrámos pelo funil das aventuras repetidas.

Dobrámos o nosso Bojador de receios e medos.

Ficámos, algures, numa praia de gente nua,

onde tudo é igual, sem interesses acrescidos,

sem as emoções que disparam os sentidos.

 

Navegámos com muitos sóis, estrelas cadentes.

Foi uma que caiu, talvez mais perto, que adormeceu

o amor que jurámos eterno, porque eternas são

apenas as palavras, não a memória delas, ditas

ou mesmo tombadas sobre papel amarelecido.

 

Não sei se é uma carta de despedida, vencida

pelo tempo, o que deixámos de ter, de sentir.

Desculpa. Só não me apetece repetir.

 

Lisboa, 31-03-2003

 
     
  Fel da vida  
     
 

Porque temos de provar o fel da vida?

Esse,

que angustia, rasga, deixa feridas abertas,

pústulas que nunca saram e só derramam

mais fel.

 

Irei um dia para monge, longe.

Numa montanha, no interior de um caverna,

sem luz, ouvindo apenas os morcegos,

alimentando-me de fungos, medos esparsos.

Até que o radar da cegueira me guie,

sem asas,

pelo espaço que não soube conquistar,

no meu tempo.

  

Lisboa, 26-03-2003

 
     
  Bagdad  
     
 

As sirenes de Bagdade

anunciam morte.

 

Mesopotâmia da prosperidade,

das confluências, cobiças e guerras.

Bagdade, centro do mundo islâmico,

criada na perfeição da forma,

é agora caça ao tesouro negro.

 

A ignorância é mais perigosa que a arma,

a insensatez desfaz corpos, ao acaso,

o poder cega todos, ditadores ou não.

Sob as areias do deserto, há sinais,

descobertos pelas tempestades repentinas.

Cada grão, que marca o tempo, tem vida,

história, ensinamentos, significado, recados.

 

Quem os não lê e não ouve está obcecado

pelas sirenes de Bagdade

a anunciarem a morte.

 

Lisboa, 20-03-2003

 
 

 

2002

 
  Gato malvado  
     
 

Malvado gato.

Mordeu-me um dedo,

arranhou-me um braço.

 

Mijou na sala,

partiu um vaso chinês.

Maltês parvo e rebelde.

 

Mas eu perdoo, enlevado.

Miado chorão, olhos de traço,

bagaço de perdição.

 

Vem cá Tigre, vem ao dono!

Ele vem a medo. Chiça!

Mordeu-me um dedo,

arranhou-me um braço.

 

Raios partam o gato!

 

Vilamoura, 08-11-2002

 
     
  Estrela cadente  
     
 

Uma estrela cadente

caiu  a meus pés

 

Rosas escarlates

surgiram de imediato

formando um círculo

em meu redor

 

Ergui-me e quis sair

mas não consegui...

 

- Fiquei prisioneiro

do esplendor!

 

Lisboa, 09-07-2002

 
     
  Casa túmulo  
     
 

Com as suas próprias mãos,

pedra a pedra, o homem

construiu a casa devagar.

O tecto, de palha amarelecida,

entrançado ao longo dos anos,

cobriu, por fim, as paredes frias.

Quando terminou, estava pronto

para morrer. A casa acabada

foi também o seu túmulo.

 

 Vilamoura, 01-07-2002

 
  Túnel escuro  
     
 

Percorro um túnel escuro.

Apenas pirilampos errantes

iluminam os contornos do caminho,

que parece não ter fim.

 

Vou perseguindo, sempre, o destino,

adivinhando linhas, formas,

fantasmas que trespasso, a passo

lento, hesitante, apressado pelo medo,

escutando, receando cada novo perigo.

 

Por fim, quando me liberto do pesadelo,

volto atrás, para percorrer de novo

a mesma estrada de segredos.

 

Lisboa, 06-06-2002

 
     
  Nenúfar  
     
 

Vivo mergulhado

num lado de cisnes.

A princípio, debicavam-me

os cabelos.

Depois, habituaram-se

ao estranho nenúfar

desenraizado.

Passam e nem ligam,

esticando os pescoços,

indiferentes

ao homem que vegeta

naquelas águas,

ausente.

  

Vilamoura, 03-06-2002

 
     
  Navegando  
     
 

Vou navegando

por esse mar de esperanças.

Umas vezes calmo

outras tormentoso,

quase sempre sem rumo,

incerto nos resultados.

 

Mas é o mar que tenho

para navegar.

Se dobro o cabo das tormentas,

vem a calmaria.

Se me queixo da falta de ventos,

desaba a tempestade.

 

Nunca encontrei um mar calmo

com vento suave e constante.

É assim a vida, que vou vivendo.

Intempestiva, mas que me mantém

acordado.

 

Vilamoura, 03-06-2002

 
     
  Montanha  
     
 

Quero ser

como aquela montanha

de verdes curtos,

quase sem vida

e de Inverno coberta

de gelo escorregadio,

o cume escondido, guardado,

por um manto de nuvens.

 

Quero ser assim, longe de tudo,

inacessível, quedado em degredos,

vencendo medos, sentindo-me único

a contemplar as estrelas.

 

Vilamoura, 02-06-2002

 
     
  Gato pintado  
     
 

O gato do quadro parece real

- glória ao seu criador!

 

Ando pela sala e ele segue-me,

com aquele olhar de felino triste.

Sento-me e ele observa-me,

com aquele olhar de felino ausente.

 

Olho-o bem nos olhos, fixamente,

e ele fita-me com se quisesse

dizer-me, ronronando baixinho:

“Oxente! Nuca viu um gato pintado?”

 

Malfadado gato que quer dar-me lições!

De sermões estou eu farto.

Raios o partam, ao gato!

 

Vilamoura, 01-06-2002

 
     
   
     
 

Ato e desato

o nó

com que me amarraste

 

Porque não sei

se me quero ver preso

a ti

Mas sei que não quero

desprender-me

 

Enquanto vou e regresso

neste percurso indefinido

só penso em ti

Ato-me e desato-me

inventariando o nosso amor

os bons e maus momentos

 

Depois de muitos nós

atados e desatados

dou um nó cego

o nó que quero

que nunca desatemos

 

Nantes, 21-04-2002

 
     
  Criação  
     
 

Tela

tintas

pincéis

algum talento

 

Mistura-se

agita-se

o cérebro

Imagina-se

inventa-se

reinventa-se

E nasce

a obra de arte

pelas mãos

do Criador

 

Vilamoura, 28-03-2002

 
     
  Não me digam  
     
 

Não

não me digam

que não posso

beber mais um copo

fumar mais um cigarro

 

Não

não me digam

que não posso

vencer o tempo

recuperar os anos perdidos

o tempo

o copo

o cigarro

 

Não

não me digam

que não posso

amar-te

ter-te

sem copo

sem cigarro

por todo o tempo

Vilamoura, 28-03-2002

 
     
  ABC  
     
 

A Bê Cê

Bê A Bá

cartilha não há

veja você

porquê

 

Se digo A

você diz Bê

nem chegamos ao Cê

 

Com opiniões contrárias

temos de achar

uma alternativa

ou mesmo várias

para encontrar

a mediana

desta relação singular

 

Eu digo sim

você diz não

discutimos

abrimos hostilidades

dizemos algumas verdades

Você chora

eu amuo

e ficamos assim toda a tarde

 

Até que um beijo furtivo

que surge do nada

faz esquecer tudo

e o Mundo desaba

e as coisas ficam assim

tão simples e agarradas

nas bocas, nos olhos

nas mãos dadas 

 

Vilamoura, 10-02-2002

 
 
 

http://www.avelinorosa.com

 

 

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